Quando estávamos nos preparando para a entrevista do CSQ, nos perguntamos: «Por que mudar para o Québec?». A resposta que sempre líamos e lemos nos blogs é em sua grande maioria «Por causa da violência».
Para nós esse também é um fator importante nessa decisão, mas a violência que nos cerca não está relacionada com o crime organizado ou o sequestro relâmpago. Diariamente vivemos um tipo de violência que não afeta a maioria das pessoas que nos cerca.
Num dia normal da nossa vida nos deparamos com pessoas que jogam lixo nas ruas, furam fila e nem percebem que estão fazendo alguma coisa errada, motoristas que não dão passagem para ambulâncias, que param em cima da faixa de pedestre, param no meio da rua pra pegar um passageiro e interrompem o trânsito e ainda dizem «é rapidinho...». De uma maneira geral, percebemos ações individuais que atrapalham o funcionamento da cidade. Pessoas que compartilham a cidade, mas não se sentem responsáveis pelo perfeito funcionamento das coisas e responsabilizam alguém quando as coisas não funcionam. «Os políticos são ladrões», «A prefeitura rouba os impostos».
Algumas experiências foram muito importantes para nós quando estivemos no Québec. Uma vez estávamos num supermercado olhando as prateleiras e, de repente olhamos para trás e uma pessoa esperava pacientemente que nós terminássemos e liberássemos a passagem. Saímos da frente e pedimos muitas desculpas. Naquele momento senti vergonha e lembrei que nós brasileiros interrompemos a passagem o tempo todo. Outra vez entramos numa loja de café e ficamos num canto para não atrapalhar ninguém enquanto escolhíamos e a cada cliente que entrava tínhamos que avisar que não estávamos na fila, pois rapidamente aprendemos que quem entra primeiro na loja tem preferência no atendimento, independente da fila. Nesse momento pensamos que esse era o lugar que gostaríamos de morar.
No APPRENDRE LE QUÉBEC, página 19 diz: «Dans la vie publique, en attente d’un service, les Québécois respectent habituellement le principe selon lequel le premier arrivé est le premier servi. Que ce soit dans un magasin, à la banque, à l’arrêt d’autobus, au cinéma, chacun attend son tour. La personne qui ne respecte pas cet usage s’expose à se faire rappeler à l’ordre par ses concitoyens».
Claro que eu imagino que algumas coisas no «guide pour réussir mon intégration» podem ser apenas ideais, mas nesse caso é verdade.
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2011-04-25
Estamos em Montréal à seis meses e realmente funciona o princípio que o primeiro que chega é o primeiro e ser atendido, mesmo quando não existe uma fila. As vezes no ponto do ônibus eu chego e já tem algumas pessoas fora da fila, então eu só entro depois que elas entrarem. Muitas vezes as pessoas ficam na dúvida de quem chegou primeiro e deixam a outra entrar na frente.
Claro que essa é a minha experiência, talvez em outros lugares funcione diferente e mesmo onde frequento acontecem desrespeitos à essa regra. Outro dia eu estava sozinho no ponto e o ônibus se aproximava lentamente (os ônibus respeitam a velocidade). De repente duas pessoas (1) atravessaram a rua fora da faixa, (2) passaram na frente do ônibus em movimento (3) correndo, esperaram o ônibus parar no ponto e (4) entraram na minha frente (quatro faltas em poucos segundos). Eu prontamente me afastei e deixei a dupla entrar, eles entraram conversando, e se dirigiram para seus lugares e não acharam nada demais. Depois que eu entrei e cumprimentei o motorista ele comentou comigo da falta de educação deles.
Outra vez o ponto estava cheio e o ônibus chegou lotado (pro padrão daqui, claro), algumas pessoas entraram e o motorista pediu que os outros no ponto esperassem o próximo ônibus e fechou a porta. Então três pessoas que estavam na fila entraram pela porta de desembarque. O motorista levantou, olhou pra trás e gritou: "Vocês que entraram pela porta de trás, por favor saiam, pois isso é falta de respeito com os outros que estão esperando lá fora". Eles desceram, simples assim.
Uma vez no metrô, uns garotos seguraram a porta pra que outro conseguisse entrar correndo. Prontamente uma mulher começou a brigar com eles e eles disseram que eles poderiam fazer o que quisessem, então ela disse que aquilo era um absurdo, que o comportamento deles estava atrasando a saída do metrô e portanto prejudicando todo mundo, logo não poderiam fazer o que quisessem. Meu instinto disse que os três garotos iam bater na mulher, mas eles ficaram quietos e ignoraram ela. Mas ela reclamou. «La personne qui ne respecte pas cet usage s’expose à se faire rappeler à l’ordre par ses concitoyens».
5 de março de 2010
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